Vovó Moderna, Feliz Dia!

A carta que a neta de 16 anos enviou à avó, num momento de desabafo e sem que tenha havido qualquer briga, conflito ou enfrentamento, é um primor de sensibilidade, para alguém tão novo e uma completa exceção quando se olha para o comportamento da juventude em geral, na maioria das vezes, alheia aos avós e ignorando suas atividades e interesses, vendo-os, ainda que novos e vigorosos, como peças de museu.

Que fizesse um bolinho de laranja ou chocolate para o lanche, uma comidinha gostosa adivinhando minhas vontades e que, principalmente, me abraçasse como julgo ser a relação de avó e neta, que me pusesse no colo. - Blog Saltitando com as Palavras
Aliás, uma das poucas coisas que me ressinto com o passar dos anos é essa postura dos jovens de não nos ver, não nos olhar; com raras exceções, até os filhos dos amigos nos cumprimentam sem dar qual quer atenção. Como seja tivéssemos passado para outro planeta.

"Sei que você não admite que lhe chame de avó e tenha instituído que nós, seus quatro netos, a tratemos apenas pelo diminutivo de seu nome. Com isso jamais usei esse delicioso e aconchegante "vovó". Ainda mais, não tendo ninguém vivo do outro lado, sabe, querida Lu (nome suposto, claro), sinto certa carência, ainda que todos julguem o máximo a nossa aproximação e intimidade.

Mas eu não acho que intimidade seja isso, assim como não sinto a menor necessidade de estar tão igual a você, que sempre enfatiza que podemos beber na sua frente, fumar, e ao meu irmão e primos mais velhos, falar de sua vida sexual, sem qualquer constrangimen to, assim como fala da sua, na condição de viúva e independente.

Ainda que as minhas amigas digam "sua avó é o máximo", para falar a verdade, sinto certo desconforto com seu jeito tão moderno, com suas roupas ousadas, seus decotes e os cabelos alongados, que você achou o máximo, dizendo que ficamos parecidas, já que seu filho e meu pai é tão ausente, distante, e embora supra tudo o que os filhos precisam, vive no mundo profissional que o cerca. Com a viuvez, então, quando éramos crianças, tornou-se mais duro na consciência da responsabilidade que teve a partir daí.

Não tendo mãe aqui e um pai assim, queria ter tido — e não leve a mal esta carta — uma avó tradicional, que fosse menos à academia e me mimasse um pouco mais.

Que fizesse um bolinho de laranja ou chocolate para o lanche, uma comidinha gostosa adivinhando minhas vontades e que, principalmente, me abraçasse como julgo ser a relação de avó e neta, que me pusesse no colo.

Sinto falta até de autoridade, de um respeito estabelecido e tradicional e, por incrível que pareça, uma doce hierarquia, que me levaria a chamá-la de senhora.

Enfim, queria que você fosse minha avó no melhor sentido do termo e não minha amiguinha. Essas, tenho muitas. Mas, você não é assim e eu te amo, de qualquer jeito".


Que fizesse um bolinho de laranja ou chocolate para o lanche, uma comidinha gostosa adivinhando minhas vontades e que, principalmente, me abraçasse como julgo ser a relação de avó e neta, que me pusesse no colo. - Blog Saltitando com as Palavras


Avó Moderna, Feliz Dia!
Texto original: Carta a uma Avó Moderna
Autor: Luiz Alca de Sant´Anna
Blog Saltitando com as Palavras


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